"Tudo já foi dito uma vez, mas como ninguém escuta é preciso dizer de novo"
André Gide
"A palavra é metade de quem a pronuncia e metade de quem a ouve"
Michel de Montaigne
Aos leitores deste artigo, considero
desnecessário contextualizar o assunto a ser tratado. Também não pretendo
discutir a fala limitadora de Silas Malafaia, mas analisar a resposta que o
geneticista Me. Eli Vieira lha deu à luz da genética. Especificamente, me
espantei com o terror que tal resposta causou em setores do movimento LGBT,
sobretudo de alguns acadêmicos adeptos à Teoria Queer. Certamente, pelo fator
histórico que as ciências biológicas desempenharam nos dois últimos séculos,
diria que tal terror é justificável, embora não seja plausível mediante aos
esforços de muitos especialistas da área de Biológicas, desde meados de 1950
até hoje, em refutar as políticas eugenistas baseadas nessa ciência.
O exercício analítico deve ser um instrumento recorrente para que os traumas do passado não impeçam diálogos possíveis entre diferentes áreas do saber comprometidas com a luta pelos direitos humanos. Diante da repulsa que a resposta causou, tendo a acreditar que tal discernimento faltou para os que criticaram a boa iniciativa do geneticista. Um dos maiores problemas na recepção do vídeo deveu-se a entendê-lo como tese e não como refutação como de fato o seja. Tantos os que o aceitaram, quanto os que o rejeitaram cometeram esse equívoco, isto é, se prenderam mais ao conteúdo e ignoraram o gênero discursivo ao que o autor se propôs fazer.
A confusão se deve ao fato de não se
diferenciar tese de refutação. Minha proposta é fazer essa diferença para,
então, identificar a proposta de Eli Vieira. Toda tese necessariamente
estabelece diálogo com outras teses e, por isso, acaba por ser um exercício de
refutação, mas isso não significa que toda refutação seja uma tese e aí é que
está o problema. A tese tem compromisso com uma pretensa verdade e, portanto,
desenvolve-se na chave verdade/fato versus mentira/falsidade. Como discurso que
se pretende verdadeiro a tese tende ao essencialismo e, logo, ao discurso
autoritário; por fim, uma vez tornada discurso autoritário, sua verdade
fundamenta-se no ethos do enunciador,
para estabelecer relações hierárquicas de poder que marcam, por exemplo, a
relação professor (metáfora originada do latim profiteri, isto é, fiteri: confessar; pro: diante de todos) e aluno (metáfora
originada do latim alumnus que
significa literalmente criança de peito, isto é, aquele que precisa ser
nutrido, alimentado).
A refutação pertence às técnicas da
retórica como exercício erístico. A erística é a arte do combate com palavras
e, como tal, seu compromisso não é com a "verdade" mas com o
verossímil. Muito utilizado pelos sofistas, essa arte foi apresentada como
método dialético por Aristóteles que a identificou como erística de raciocínio.
Nos diálogos de Platão, tal método é utilizado por Sócrates e pode, conforme
define Vitor Goldschmidt, se estabecer de três maneiras: et alia (literalmente e
também) et opositum (o contrário)
et idem non (e também não). A
primeira, como crítica-argumento denominada et
alia, apresenta uma imagem como definição do conceito: Eutífron define o
conceito de "piedoso" a Sócrates, dando exemplo da ação que moverá
contra seu pai, em Eutífron. Sócrates
apresenta outras imagens concorrentes a essa, as quais são tão legítimas quanto
ela para definir o conceito de "piedoso" e, com isso, refuta a
definição de seu interlocutor. A segunda como crítica-argumento é denominada et oppositum, o propositor apresenta uma
imagem que será rebatida com uma contra-imagem: na obra intitulada Laques, a personagem Laques apresenta
como exemplo de corajoso o hoplita
que, sem se mexer, continua em seu posto e Sócrates dá-lhe uma outra imagem, os
citas, cuja tática é combater recuando. Se for corajoso permanecer no posto sem
recuar, o recuo enquanto tática de combate também define o conceito de "corajoso",
apresentando-se uma contra-imagem para refutar a primeira. A terceira é
denominada et idem non: ao definir o
conceito de "beleza", Hípias apresenta a imagem de uma bela moça,
Sócrates para refutar a tese de Hípias, compara a beleza da moça à da Deusa e
afirma ser aquela feia em relação a essa. Essa refutação é ela mesma seu
contrário.
Contando com a paciência dos
leitores, essa diferenciação faz-se necessária para entender a dinâmica do
vídeo de Eli Vieira. Desse modo, entendê-lo como uma tese que se pretende
explicar geneticamente as origens da homossexualidade é um equívoco perigoso
que pode levar os que criticam àquilo que criticam, isto é, ao não entender a
dinâmica retórica do geneticista, acusando-o de determinista ou essencialista,
cair no essencialismo ou determinismo cultural. Esse determinismo cultural
acaba propondo, no limite, que apenas as áreas de humanas podem tornar-se
discursos políticos e as demais devem limitar-se a seus laboratórios.
O exercício que Eli Vieira faz é o
da refutação. Conforme afirmou posteriormente em seu perfil no facebook, defendendo-se
dos ataques que sofreu, ele também não acredita que a genética seja relevante
para o debate da orientação sexual e identidade de gênero:
"Quem
está dizendo que a genética é irrelevante para a questão da promoção da
igualdade das pessoas independente de orientação sexual e identidade de gênero
TEM RAZÃO. O que fiz foi proteger minha área de atuação profissional de
uma calúnia pública proferida por um leigo. Não é por acaso que
pensadores tão grandes quanto David Hume e Immanuel Kant convergiram em separar
o que são "questões de fato" do que são "questões de
direito". Separar "é" de "deve ser". E eu estou
falando apenas da primeira categoria. Os colegas acadêmicos que me
atacam apenas por ser geneticista estão presumindo demais. Saibam que somos
aliados contra o obscurantismo teocrático que tolhe direitos e esmaga vidas".
Embora Eli Vieira reafirme não ter o
objetivo em defender uma tese sobre as origens da homossexualidade à luz da
genética, entendo que um exame atento ao modo como operou seu discurso no vídeo
já era por si só suficiente para mostrar isso. A falta de um exercício
analítico pode ser muito prejudicial à sociedade, uma vez que, além de nos
levar a um determinismo cultural, pode fazer com que a interdisciplinaridade,
necessária para o conhecimento, seja impossível de se alcançar, pois ninguém
gosta de tomar porrada.
Conforme já afirmei em outros
momentos e espaços, reafirmo aqui: o objeto de análise/ataque/discussão do
vídeo de Vieira não é a homossexualidade em si, mas o discurso de Malafaia.
Percebemos isso, quando Vieira cita o exemplo dos irmãos gêmeos: não é a
homossexualidade que está sendo tratada, mas a refutação ao exemplo que SM
usou. Segundo a retórica, o exemplo tem efeitos de sentido metonímicos, isto é,
um caso particular citado como exemplo, perde sua particularidade para
tornar-se representação de um todo. O exemplo é, entre todas as técnicas da
retórica, a mais poderosa, utilizado recorrentemente no exercício da
manipulação, pois, além da facilidade de usá-lo, o exemplo concretiza a teoria,
isto é, faz o abstrato tornar-se "palpável", bem como, tem efeitos
performativos, isto é, ao exemplificar, cria efeitos de realidade e, portanto,
fundamenta a ilusão da verdade. Ora, como fazer para desconstruir esse poder do
exemplo? Para desestabilizar a crueldade manipulatória do exemplo, o
contra-exemplo torna-se fundamental.
É nesse campo que opera basicamente
o discurso de Eli Vieira: ao invés de defender uma tese, com pretensão de
explicar geneticamente a homossexualidade, ele seleciona cada afirmação de
Malafaia e propõe contra-exemplos. Vamos a uma breve análise: O geneticista
inicia, operando o esvaziamento na afirmação de Malafaia quando este diz que a
homossexualidade é um comportamento. A partir do esvaziamento da catacrese
"comportamento", ele cria um desvio a partir de seu conhecimento
sobre genética; em um segundo momento, aceita a afirmação de SM sobre ser a
genética quem diz se uma pessoa nasce ou não gay, para então, propor o contrário
do que seu opositor afirma (talvez aqui seja o nódulo de incômodo dos culturalistas,
pois em uma primeira análise parece que ele aceita a tese do SM). Contudo, como
pretende refutar o adversário, a aceitação é apenas um recurso retórico para
apresentar o contrário com base em teorias que o opositor desconhece. No terceiro
momento, a oposição é explícita e por isso, Vieira utiliza-se da pergunta
retórica com efeitos de sarcasmos, acentuando a incompetência do opositor sobre
o assunto para novamente recorrer à literatura científica que reforça o
desconhecimento do fundamentalista.
Poderia desenvolver a análise sobre
todo o vídeo, mas tenderia a extensão e causaria cansaço no leitor. Esses
procedimentos apontados vão desenvolver-se por todo o vídeo como exercício de
refutação e, com isso, evidenciar a contradição do discurso de seu interlocutor
e mostrar sua incompetência no que diz. Ao fim, ele remata o discurso de seu
opositor e afirma: Se você vai negar uma
teoria que é aceita pela esmagadora maioria dos profissionais da área que
trabalham com biologia, eu acho que eu vou poder duvidar da sua capacidade de
olhar para a questão da contribuição da genética para a orientação sexual, eu
acho que eu vou duvidar da sua imparcialidade, Malafaia, eu vou duvidar também
da sua formação e, inclusive, do seu respeito por informação científica e
fontes científicas... Fica evidente, pelo menos para mim, que, longe de
querer defender uma tese, o método do vídeo é puramente erístico e, não
perceber o exercício retórico de desconstrução do discurso do outro, é
fechar-se em um academicismo preconceituoso e egocêntrico que nada contribui
para emancipação humana.
Por fim, o incômodo e o mal uso
desse vídeo por alguns que ingenuamente se empolgaram com o discurso biológico
não se deve, conforme supôs o Prof. Dr. Leandro Colling, ao fato de que o
discurso biológico é mais atraente, mas que os não-acadêmicos ou acadêmicos de
áreas outras que não tratam diretamente de sexualidade, indignados com a
homofobia desse tosquiador de ovelhas, usaram, como forma de vingança aquilo
que puderam ter em mãos: uma indignação, uma vontade, um conhecimento e uma
câmara nas mãos, em outras palavras, o vídeo do geneticista Eli Vieira. Quantos
antropólogos refutaram Malafaia em sua área de saber de modo político e
acessível como o fez Vieira? Quantos historiadores, sociólogos, cientistas
políticos, literatos também o fizeram? Esta é a diferença.
Eli Vieira foi propositivo e
dialogou com pessoas que, inclusive tinham uma concepção mais conservadora das Ciências
Genéticas. Enquanto isso, muitos antropólogos, historiadores, sociólogos,
literatos, cientistas políticos, filósofos preferem continuar em suas torres de
marfins, seus simpósios, seus congressos, suas publicações, suas linguagens
empoladas, suas escritas em javanês, deixando vago esse espaço tecnológico e
midiático para falsos profetas, panurgistas e tosquiadores de ovelhas ocuparem
e violarem os direitos da população LGBT, população Negra, Mulheres, Índios,
Ciganos, pessoas vivendo na rua, etc. Enquanto as bibliotecas das Universidades
se enchem de teses inovadoras, a mídia se sobrecarrega de falas conservadoras
fazendo com que a humanidade retroceda pelo silêncio daqueles que poderiam
fazer diferença no mundo. Penso que a academia deveria ser um pouco mais
humilde e humanizadora e utilizar-se dos novos meios tecnológicos para a
emancipação da sociedade, tirando-nos desse obscurantismo religioso que ora o
Brasil tem se afundado com ajuda inclusive de Partidos de Esquerda. O vídeo de
Eli Vieira é uma bela lição do quanto a ciência pode e deve ser utilizada para combater
a ignorância e promover os Direitos Humanos.
Concordo! Concordo e concordo!
ResponderExcluirBelo texto!! infelizmente acho que acontece realmente esse isolamento e academicismo nas ciencias humanas. Falta peito pra entrar no debate. No entanto, aqui vai uma exceção: http://www.justtv.com.br/portal/entretenimento/hora-da-coruja/ateismo-datena-e-silas-malafaia-parte-2/
ResponderExcluirAVISO: Peço às pessoas que não postem mensagens ANONIMAMENTE, pois as mesmas serão apagadas. Não acredito em discursos sem sujeitos e por isso, acho fundamental saber quem diz. OBRIGADO!
ResponderExcluirMantenho o que falei no post apagado. A mensagem foi como anônima porque não sei usar esses instrumentos de internet direito. De qqer forma, tome como uma crítica construtiva, ainda que possa ter parecido agressiva, e, nesse caso, peço desculpas. O texto é muito bom, mas teria um alcance muito maior com as sugestões dadas.
ExcluirInternet é velocidade. Queiramos ou não, certo ou errado, o fato é que as pessoas não leem textos tão longos e academicamente tão complexos. Lembre-se de que seu público na internet não é só de pessoas com nível universitário.
Caso a mensagem apaeça de novo como anônimo, meu nome é Everton de Lima Oliveira. Vc me acha fácil no Facebook.
Abraços
Oi Everton,
ExcluirObrigado por ter assinado. Não tenho problema algum em lidar com críticas, mas não respondo mensagens anônimas, independente de serem críticas ou elogiosas. o texto pretendeu ser técnico e, portanto, faz uso de termos técnicos o que dificulta para alguns, talvez eu pudesse colocar notas de rodapé explicando conceitos, mas eles são necessários. Caso ache relevante a nota de rodapé, peço-lhe o favor que marque o que vc considere rebuscado ou técnico de mais. Lhe agradeceria a gentileza. Além disso, de fato, tenho este limite, minha escrita esbarra em certas expressões e termos que não são de uso comum. Aviso que quando li pela primeira vez, eu gostei da sua crítica e ia até respondê-la, contudo, não o fiz pois não sabia a quem estava me dirigindo. Abraços e obrigado por manter seu comentário agora identificado.
A MeGaLOBO RACISMO? A violência do preconceito racial no Brasil personagem (Uma negra degradada pedinte com imagem horrenda destorcida e bosalizada é a Adelaide do Programa Zorra Total, Rede Globo do ator Rodrigo Sant’Anna? Ele para a Globo e aos judeus é engraçado, mas é desgraça para nós negros afros indígenas descendentes, se nossas crianças não tivessem sendo chamadas de Adelaidinha ou filha, neta e sobrinha da ADELAIDE no pior dos sentidos, é BULLIYING infeliz e cruel criado nos laboratórios racistas do PROJAC (abrev. de Projeto Jacarepaguá, como é conhecida a Central Globo de Produção) é o centro de produção da Rede Globo que é dominado pelos judeus Arnaldo Jabor,Carlos Sanderberg, Luciano Huck,Tiago Leifert, Pedro Bial, William Waack, William Bonner&Fatima Bernardes, Mônica Waldvogel ,Ernesto Paglial& Sandra Annenberg,Wolf Maya,Caio Blinder,Daniel Filho e o poderoso Ali Kamel diretor chefe responsável e autor do livro Best seller o manual segregador (A Bíblia do racismo,que ironicamente tem por titulo NÃO SOMOS RACISTA baseado e num monte de inverdades e teses racistas contra os negros afro-decendentes brasileiros) E por Maurício Sherman Nisenbaum(que Grande Otelo, Jamelão e Luis Carlos da Vila chamavam o de racista porque este e o Judeu sionista racista Adolfo Block dono Manchete discriminavam os negros)responsável dirige o humorístico Zorra Total Foi o responsável pela criação do programa e dos programas infantis apresentados por Xuxa(Luciano Szafir) e Angélica(Luciano Hulk) ambas tendos seus filhos com judeus,apresentadoras descobertas e lançadas por ele no seu pré-conceitos de padrão de beleza e qualidade da Manchete TV dominada por judeus sionistas,este BULLIYING NEGLIGENTE PERVERSO que nem ADOLF HITLER fez aos judeus mas os judeu sionistas da TV GLOBO faz para a população negra afro-descendente brasileira isto ocorre em todo lugar do Brasil para nós não tem graça, esta desgraça de Humor,que humilha crianças é desumano para qualquer sexo, cor, raça, religião, nacionalidade etc.o pior de tudo esta degradação racista constrangedora cruel é patrocinada e apoiada por o Sr Ali KAMEL (marido da judia Patrícia Kogut jornalista do GLOBO que liderou dezenas de judeus artistas intelectuais e empresários dos 113 nomes(Contra as contra raciais) com o Senador DemóstenesTorres que foi cassado por corrupção) TV Globo esta mesma que fez anuncio constante do programa (27ª C.E. arrecada mais de R$ 10,milhões reais de CENTARROS para esmola da farsa e iludir enganando escondendo a divida ao BNDES de mais de 3 bilhões dollares dinheiro publico do Brasil ) que tem com o título ‘A Esperança é o que nos Move’, o show do “Criança Esperança” de 2012 celebrará a formação da identidade brasileira a partir da mistura de diferentes etnias) e comete o Genocídio racista imoral contra a maior parte do povo brasileiro é lamentável que os judeus se divirtam com humor e debochem do verdadeiro holocausto afro-indigena brasileiro é lamentavel que o Judeu Sergio Groisman em seu Programa Altas Horas e assim no Programa Encontro com a judia Fátima Bernardes riem e se divertem. (A atriz judia Samantha Schmütz em papel de criança no apoteótico deste estereótipo desleal e cruel se amedronta diante aquela mulher extremem ente feia) para nós negros afros brasileiros a Rede GLOBO promove incentivo preconceito raciais que humilha e choca o povo brasileiro.Taryk Al Jamahiriya. Afro-indigena brasileira da Organização Negra Nacional Quilombo – ONNQ 20/11/1970 – REQBRA Revolução Quilombolivariana do Brasil quilombonnq@bol.com.br
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