"E nada defende melhor os seres vivos contra a estupidez dos preconceitos, do racismo, da xenofobia, das obtusidades localistas do sectarismo religioso ou político, ou dos nacionalismos discriminatórios, do que a comprovação constante que sempre aparece na grande literatura: a igualdade essencial de homens e mulheres em todas as latitudes e a injustiça representada pelo estabelecimento entre eles de formas de discriminação, sujeição ou exploração".
Mario Vargas Llosa
No
dia de hoje (16/10), foi aprovado na famigerada Comissão de Direitos Humanos e Minorias
da Câmara Federal o Projeto de Lei 1411/2011 de autoria do Deputado Washington
Reis PMDB/RJ que altera a lei 7716/1989, cujo conteúdo define os crimes resultantes de
raça ou de cor[1].
Segundo a proposição desse projeto de lei, o artigo 20 não se aplicaria às
organizações religiosas, desde que qualquer ato considerado discriminatório
seja praticado de acordo com valores, doutrinas, crenças e liturgias dessas
organizações. E o que diz o artigo 20 da lei 7716/1989? Afirma ser crime praticar,
induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião
ou procedência nacional,
especificando nos parágrafos 1 e 2: (§ 1º) fabricar, comercializar,
distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou
propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do
nazismo. (§ 2º) Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por
intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza.[2]
O parecer favorável ao PL na
Comissão foi feito pelo Deputado Jair Bolsonaro PP/RJ. Embora o projeto de lei
não se refira aos "homossexuais" em específico, o parecerista
apresenta um dos principais motivos para que a lei seja aprovada. Diz ele:
Assinala o autor do projeto que o
princípio da liberdade de consciência e de crença, proclamado no inciso VI, do
art. 5º, da Constituição Federal, constitui cláusula pétrea.
Assim, merece atenção o fato da
prática homossexual ser descrita em muitas doutrinas religiosas como uma
conduta em desacordo com suas crenças.
Argumenta o autor que o direito
das minorias e a legítima promoção do combate de toda e qualquer forma de
discriminação deve ser feito sem infringir outros direitos e garantias
constitucionais e sem prejudicar princípios igualmente constitucionais.[3]
Primeiro,
há que se considerar a perseguição declarada à população LGBT no discurso intolerante desse deputado, à medida
em que esse projeto pretende salvaguardar as organizações religiosas, caso o PLC 122 seja
aprovado. Visto que a lei 7716/89 ainda restringe-se à prática de intolerância
por motivo de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, ela não se
refere ainda à intolerância por orientação sexual e identidade de gênero. Como era de se esperar, a Comissão nas
mãos do PSC tem funcionado para propor ações que, direta ou indiretamente,
legitimem os discursos de ódio contra a população LGBT. Como militante LGBT e
cristão, sei que, dificilmente, LGBT se interessarão a buscar benção nesses
templos que disseminam ódio e intolerância contra nossa população.
Segundo, a gravidade não está apenas nisso
(embora, o projeto permite que LGBT possam ser expulsos desses locais sem
configurar discriminação), mas no fato de que o artigo 20, além de punir
qualquer espaço, pessoa ou entidade que discrimine pessoas por motivo de raça, cor,
etnia, religião ou procedência nacional,
também pune qualquer crime cometido
por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer
natureza, bem como proíbe a fabricação, comercialização, distribuição ou veiculação de símbolos,
emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou
gamada, para fins de divulgação do nazismo.
Caso
esse PL seja aprovado, significará o retrocesso contra o combate aos crimes de
ódio, visto que organizações religiosas, ou as que assim se definirem, terão salva
conduta para disseminar discursos de intolerância. Pela lei em vigor, qualquer
religioso que fizer discurso de ódio atacando a população negra conforme faziam
na época do Brasil colônia, ou atacando religiões de matrizes afro, religião
judaica ou qualquer outra religião, poderá ser enquadrado criminalmente. Se
esse PL, tramitando agora na CCJ, for aprovado no Plenário e sancionado pela Presidenta,
qualquer organização religiosa poderá reavivar o discurso utilizado na Idade
Média como forma de justificar a escravidão dos povos africanos, ao afirmar ser
a África um continente amaldiçoado, com base na história de Noé e da maldição
de seu filho Cã. Poderá também fabricar,
comercializar, distribuir ou veicular materiais ou propaganda com a cruz
suástica, divulgando o nazismo. Também, terão total liberdade para fazê-lo por
intermédio dos meios de comunicação social.
Esses
deputados da bancada religiosa comumente acusam o movimento LGBT de buscar
privilégios e ameaçar a suposta "liberdade de expressão" desse
cristianismo intolerante. Este PL deixa evidente quem de fato são os
interessados em buscar fórum privilegiado, bem como ameaçar a liberdade de
expressão das pessoas que não comungam da mesma crença que eles. Neste sentido,
derrotados com arquivamento do absurdo projeto de lei do Deputado João Campos PSDB/GO,
esta bancada da intolerância ressurge com um novo golpe à sociedade. Agora, o
alvo não é apenas a população LGBT, é também a população negra, população
cigana, a comunidade judaica, população indígena, as mulheres e todos os grupos
que historicamente foram alvos da tirania e do ódio desses que vivem em função
do nome de Deus. A PL 1411/2011 desse Deputado do PMDB/RJ é um ataque violento
aos Direitos Humanos, ao Estado Democrático e, portanto, lutar contra deve
tornar-se mais uma bandeira dos movimentos sociais.
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