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domingo, 28 de julho de 2013

VIOLÊNCIA OU REAÇÃO SIMBÓLICA?

Imagem de Marcelo Tasso

"Nossas vidas começam a morrer no dia em que calamos coisas que são verdadeiramente importantes."
Martin Luther King

"Que é mesmo a minha neutralidade senão a maneira cômoda, talvez, mas hipócrita, de esconder minha opção ou meu medo de acusar a injustiça? Lavar as mãos em face da opressão é reforçar o poder do opressor, é optar por ele".
Paulo Freire


               Hoje, mais do que nunca, a frase "não confundam a reação do oprimido com a violência do opressor" me fez muito sentido. Refiro-me ao episódio na Marcha das Vadias no Rio de Janeiro, onde duas manifestantes fizeram uma performance na qual quebraram as imagens de "Nossa Senhora de Aparecida" e "Nossa Senhora de Fátima". Não se trata de imagens furtadas de qualquer Igreja Católica. Não se trata de imagens arrancadas das mãos de fiéis. Trata-se de imagens que foram compradas pelas manifestantes. Fosse eu quebrando um tablet caríssimo, não causaria tamanha comoção, certamente, sequer daria mídia. E por qual razão essa performance provocou tanto comentários contrários e negativos? Pelo fato simbólico que a performance pretendeu, e conseguiu, representar.
         
  
          Entre os muitos comentários que li, o mais recorrente foi o de que: se católicos ou evangélicos queimassem bandeiras do movimento LGBT ou do movimento Feminista certamente estes movimentos se sentiriam agredidos. E foi exatamente estes comentários que me fizeram ver o sentido da frase acima citada. Se o incômodo em relação a tal ação deveu-se pelo fator simbólico que a performance pretendeu, que discutamos então no campo do simbólico. Duas imagens foram quebradas. Materialmente, o que isto resulta: nada. Nenhum direito violado. Por mais que alguns possam dizer que seja intolerância religiosa, o direito à religião não foi violado. A performance não pôs fim à JMJ; a performance não resultou na perseguição de religiosos; a performance não comprometeu o direito à religião. A performance apenas representou a reação do oprimido frente as constantes violações de direito do opressor. Logo, materialmente, nenhum direito dos religiosos foi violado com esta performance.
               Contudo, ao colocar no mesmo patamar da opressão, isto é, dizer que esta performance equivale a queima das bandeiras dos dois movimentos é apagar a história de violação de Direitos perpetrada por esta instituição religiosa: é confundir propositadamente a reação do oprimido com a violência do opressor. Pior que isso, é ignorar que historicamente a Igreja Católica tem queimado simbolicamente as bandeiras do movimento feminista, do movimento LGBT e do movimento negro. A Igreja Católica é a inimiga número um, porque é a mais poderosa, dos direitos da população LGBT; é a inimiga declarada dos direitos das mulheres sobre seu corpo e sobre o seu destino; é a inimiga histórica dos direitos da população negra no Brasil e no mundo ao demonizar sua religião, ao ter promovido a escravidão de seus ancestrais, ao ter destruído toda sua cultura, ao ter dizimado incontáveis comunidades africanas, apagando-as da memória da humanidade.
               O Papa, renunciado ou não, não hesita em se colocar contrário aos avanços das políticas de reparação que garantam a dignidade mínima destas populações. Em nome de uma pretensa fé, e de uma pretensa representação do "divino" por ela mesma produzida, dissemina pelo mundo, na mente e na alma de seus fiéis, nas instituições estatais de todo o planeta o ódio, a intolerância e a condenação dessas populações. Quando a Igreja Católica se coloca contrária aos direitos da população LGBT, ela queima a bandeira do Arco-Íris e, mais que isso, ao dizer que as relações homoafetivas e o direito à identidade de gênero são manifestações pecaminosas, a Igreja autoriza os assassinatos cotidianos que acontecem contra esta população.
               No caso das mulheres há um agravante. Longe de se restringir ao campo do religioso, tais imagens performatizam o modelo ideal do ser mulher. A performance destas imagens tem, no campo do simbólico, o efeito danoso de disciplinar o que seja o normal e assim expulsar das possibilidades de feminino, inúmeras diversidades, tratando-as como anormais. Neste sentido, tais imagens "sacras" femininas, associadas ao campo do sagrado, sacralizam o corpo da mulher, mesmo o corpo de mulheres que não são católicas. Ao sacralizá-lo, rouba desta mulher o seu direito ao corpo e coloca no campo da condenação, do castigo eterno, da danação, todas as mulheres que não se enquadrarem nesta norma disciplinadora da imagem sacra. As duas imagens têm efeitos violentos na construção simbólica do que seja ser mulher: pura, santa, imaculada, assexuada, branca, bela, singela, meiga e, portanto, com direito à vida. Qualquer mulher que fuja deste modelo, qualquer mulher que não se enquadre neste ideal, qualquer mulher que rompa com esse modelo deve ser punida simbolica e materialmente e, portanto, condenada à morte.
               A violência, mesmo no campo do simbólico, só pode ser considerada como violência quando se materializa em danos perversos aos direitos dos violentados. Novamente pergunto: materialmente, no que atingiram a destruição destas duas imagens? Em nada. Logo, ela não é violenta. Muito pelo contrário, ela é reação à violência milenar e sentida cotidianamente no corpo de todas as mulheres. Porque as mulheres têm tanta dificuldade de se manifestarem em público? Porque mulheres têm tanta dificuldade em relacionarem-se em pé de igualdade com os homens? Porque mulheres devem vigiar constantemente suas vestimentas? Porque milhares de mulheres sequer sabem o que é ter um orgasmo? Porque mulheres são espancadas e/ou mortas por seus maridos, companheiros, pais, irmãos, filhos ou parentes? A resposta é bem simples: porque essas duas imagens (e outras tantas iguais a elas) foram, há séculos, erigidas simbolicamente como o modelo de ser mulher.

               Por fim, eu poderia dizer que essa performance é uma liberdade de expressão tal qual a liberdade de expressão em dizer que homossexuais são pecadores ou em dizer que mulheres que se negam a serem submissas a seus maridos são pecadoras tão reinvindicada por religiosos intolerantes. Mas seu eu fizesse isso, cometeria um erro gravíssimo. Qual seja? Novamente, volto à ideia do que seja violência: repito em dizer que esta performance não causou danos materiais aos religiosos católicos. Só há violência no campo do simbólico quando se materializa na vida das pessoas. O mesmo não é verdade quando condenam mulheres, LGBT ou religiões de matrizes afro. A falaciosa liberdade de expressão desses fiéis contra os direitos das mulheres, de LGBT e da população negra causam cotidianamente e historicamente danos terríveis e muitas vezes irreversíveis aos direitos destas populações. Por isso, peço a quem ler: debatam o tema, apresentem argumentos, seja contrário ou a favor a esta performance, mas, por favor, NÃO CONFUNDAM A REAÇÃO DAS OPRIMIDAS COM A VIOLÊNCIA DO OPRESSOR.

39 comentários:

  1. Só isto a dizer: CP Art. 208 "Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso":

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    1. Isso pressupõe uma pessoa que tenha sido escarnecida. O que não houve do caso. Não se estava escarnecendo de nenhuma pessoa em particular por motivo de crença ou função religiosa, nem se impediu ou perturbou ninguém.
      Quanto à vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso: ninguém se comove tanto quando os cristãos fazem isso com os atos ou objetos das religiões de matizes africanas não é mesmo? Por séculos a Igreja Católica vilipendiou os atos ou objetos de culto religioso da população indígena deste país, ao ponto de praticamente extinguir essas religiões. Quando isso aconteceu, não apareceu ninguém citando artigos da Constituição.

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    2. talvez porque não havia ainda nem mesmo uma Constituição... Às vezes eu me pergunto porque tanta gente pensa na igreja católica como se ainda estivéssemos na inquisição... Apesar das cédulas de real, presume-se que o estado seja laico e que as pessoas possam agir conforme o que pensam. Porque então se revoltar contra outra religião?

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    3. Porque, anônimo, em muitos aspectos ainda estamos na idade média, como qdo se proíbe uma criança estuprada de abortar.

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  2. E elas conseguiram: se rebaixaram ao agressor, pagaram com a mesma moeda. Agora são tão agressoras quanto. São tão opressoras quanto aqueles que as oprimem. Esse comportamento não mostra indignação, não se trata de resposta aos anos de preconceito sofrido, mas de uma tentativa clara de se tornar um grupo a se temer, de ser o próprio opressor. Por que oprimir e desrespeitar aqueles que as oprimem ou desrespeita? Provavelmente, porque é o único modelo de demonstração de indignação conhecido. Triste saber que mesmo aqueles que lutam pelos seus direitos os fazem imitando o modelo alheio de dominação (ou tentativa de, pelo menos). Fazer o que foi feito foi um exagero, não há duvidas. Não era necessário. Quanto mais a reação do que você chama de "oprimidas" for exagerada, mais forte será a mão do opressor. Só pensem como reagiriam se a partir de agora em manifestações "pacíficas" os religiosos passassem a comprar e queimar bandeiras do arco-íris. Vocês estão perdendo o foco de uma luta que poderia ser linda e bem sucedida. Não precisa, o movimento LGBT é muito maior que isso e não vai ser através de um comportamento pseudolibertário que seremos capazes de mudar os pensamentos e opiniões. Respeito gera respeito; só gentileza gera gentileza.

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    1. Bernardo. A Marcha das Vadias não é um ato do Movimento LGBT, e sim do Movimento das Feministas. O Movimento LGBT é apenas solidário com as Feministas, e têm algumas pautas em comum.

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    2. você se deu o trabalho de ler o texto?

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    3. Dizer que se reagir, você se torna o opressor é exagero. Para você ser o opressor, você deve ter como premissa básica ter o poder, em qualquer de suas formas. O lado sem poder justamente é o oprimido. Simples definição. Martin Luther King.

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  3. Pois é, e desrespeito gera desrespeito!
    O dia que essa igreja parar de se meter em assuntos que não dizem respeito somente a seus fiéis eu paro de falar de assuntos que só não me dizem respeito.
    A jurisdição eclesiástica se estende até os batizados. O que vemos, para além disso, é a CORROSÃO da LAICIDADE dos Estados praticada diariamente pelo Vaticano nos mais diversos assuntos da vida cotidiana. Diante disso, essa manifestação - que se enquadra plenamente como liberdade de expressão e manifestação - significa apenas que cada um colhe o que plantou.

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    1. Oi anônimo!
      Só pra te deixar espertex:

      Estado Laico não se cobra de religião, se cobra DO ESTADO.

      Durma com esta e vá estudar (e entender)

      ;)

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    2. Alexandre, engraçado você querer "me deixar esperta", pedir que eu "durma com esta e vá estudar (e entender)" depois de ter postado uma frase tão simplória e simplista como essa... Com toda essa moldura publicitária, esperava que o conteúdo da sua lição realmente acrescentasse algo, porque de fato gosto muito de aprender. Mas dessa vez não foi o que aconteceu, infelizmente.
      Eu, de fato, estudo a história da Igreja Católica. Não digo isto em sentido figurado: é realmente o tema da minha pesquisa de pós-graduação, que desenvolvo há 4 anos na Faculdade de História.
      Mas não me interessa usar isso para rebater seu argumento, porque não se trata de uma questão de autoridade no assunto. O problema se dá e se resolve no plano das ideias e das práticas, mesmo.
      Em nenhum momento eu disse de quem deveríamos cobrar a laicidade do Estado. Fiz uma constatação: "O que vemos (...) é a CORROSÃO da LAICIDADE dos Estados praticada diariamente pelo Vaticano nos mais diversos assuntos da vida cotidiana". Essa constatação talvez te incomode, mas isso não me preocupa.
      Se a Igreja usa de seu poder - e do de uma mídia que também desconhece o princípio da laicidade do Estado brasileiro, além de muitos outros - para influenciar políticas públicas e políticas de Estado dá pra compreender a reação das pessoas contra essa Igreja. Querer naturalizar essa instrumentalização da fé para além da esfera que lhe é própria é que não dá - ou você acha que o candomblé e a umbanda têm o mesmo poder de barganha política e as mesmas pretensões de imposição da sua visão de mundo por meio da máquina estatal?
      Agora, se você quer sair do plano ôntico para o deôntico, então lhe diria: devemos cobrar do Estado, sim, mas precisamos criticar quem quer que venha com essas pretensões sobre o Estado. Porque no braço de ferro dos poderosos no Brasil o silêncio da população já mostrou inúmeras vezes a quem beneficia.
      Fernanda

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    3. Boa resposta, Fernanda..

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  4. Hahaha hahaha hahaha hahaha hahaha hahaha hahaha hahaha hahaha hahaha hahaha hahaha
    Estou rindo muito da cara de quem escreveu esse texto hahaha hahaha

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  5. "Só há violência no campo do simbólico quando se materializa na vida das pessoas"

    quem escreveu esta frase não leu ou não entendeu porra nenhuma de Bourdieu

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    1. Concordo. Mas Bourdieu descansa em paz, acostumado com erros de avaliação de suas ideias. Ademais, a frase não pode ser analisada isoladamente.

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    2. Fique à vontade, caso vc dê conta, para debatermos o conceito de violência simbólica em Bourdieu (embora não necessariamente, eu esteja me referindo a ele) e, aproveita, caso não tenha medo, para se identificar...

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    3. Não somente na de Bourdieu, mas nem na de Lacan e nem na de ninguém que eu me recorde essa frase "Só há violência no campo do simbólico quando se materializa na vida das pessoas" faz sentido.

      O texto tem muitas contradições e o que fica de interessante no meio disso tudo foi aquilo que não é novidade para quem tem um posicionamento libertário:"historicamente a Igreja Católica tem queimado simbolicamente as bandeiras do movimento feminista, do movimento LGBT e do movimento negro. A Igreja Católica é a inimiga número um, porque é a mais poderosa, dos direitos da população LGBT; é a inimiga declarada dos direitos das mulheres sobre seu corpo e sobre o seu destino; é a inimiga histórica dos direitos da população negra no Brasil e no mundo ao demonizar sua religião, ao ter promovido a escravidão de seus ancestrais, ao ter destruído toda sua cultura, ao ter dizimado incontáveis comunidades africanas, apagando-as da memória da humanidade".

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    4. É difícil dialogar com um texto anônimo, vc poderia se identificar? Do contrário, não tenho como dialogar com vc.

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    5. Porque preciso me mostrar para dialogarmos?
      Aqui o que importa é A TROCA DAS IDEIAS então saber se é Pedro, Tiago e João (no barquinho) não é o que importa.
      Mas, sobre os saberes localizados de Dona Haraway, sou mulher, negra, nordestina, psicóloga...

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    6. Não iremos mesmo dialogar?

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  6. Pensar na "reação do oprimido" realmente me faz enxergar a performance com um outro olhar, que foge ao senso comum.


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  7. muito bom o texto.
    o algoz se disfarça de vítima nos dias de hoje.
    a igreja católica é uma instituição decadente, mas que infelizmente ganha força num país como o brasil, através de uma mídia (ferramenta do estado) que tenta a qualquer custo, desviar os olhares das pessoas da bagunça em que o país se encontra, mostrando uma festa católica em vez de mostrar a sincera indignação do povo nas ruas.
    a igreja católica é uma instituição decadente que tem na imagem do papa, um estandarte de preconceito e opressão milenar. a igreja, grande vilã na história do mundo, agora vem se fazer de vítima, após anos e anos de assassinatos simbólicos e reais.

    muito bom o texto. parabéns


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    1. Concordo que a Igreja seja tudo isso e com a crítica da mídia focar no Papa, contando onde ele almoçou, o que comeu, se peidou... E, intencionalmente, não transmitir as OCUPAÇÕES (nas ruas, nas Câmaras, nas Universidades Federais...) Isso é reflexo da nossa instituição ESTADO.

      MAS o texto se propôs a defender que as atitudes na Marcha das Vadias, de quebrar as imagens de Santas (e também não podemos esquecer que meteram o crucifixo no cu) foram legítimas e o autor utiliza o campo simbólico para argumentar, mas ele não analisou o lado simbólico em nenhum momento (se teve, foi um ou outro que eu nem me recordo).
      E se a gente não se ater ao conceitual, ainda sim, ele não trouxe nenhum argumento que faça refletir que essa ação que houve no Movimento das Vadias luta por um Estado Laico, essa atitude soou mais como anti-cristã.
      A questão não é julgar se foi certa ou errada a atitude dos manifestantes. Quebrar essas imagens não me chocou porque essas imagens não fazem parte de minha crença, MAS acho que é preciso analisar o MOVIMENTO do posicionamento LIBERTÁRIO. Essa atitude gerou frutos positivos para a luta? (quais?) Será que essa atitude não colocou o movimento libertário no mesmo posicionamento que ele tanto critica (a opressão???

      O massa disso tudo é que o ASSUNTO ESTÁ CIRCULANDO, SE MOVIMENTANDO, mas o que me entristece é que está mais num nível de dizer se é 'certo ou errado' do que a discussão do posicionamento (em todos os sentidos) da população LGBT, das mulheres, dos negros, Amarildo, presos, índios e tantos outros em nossa sociedade.

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    2. É difícil dialogar com textos não assinados... se vc se identificar, podemos conversar...

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    3. Porque preciso me mostrar para dialogarmos?
      Aqui o que importa é A TROCA DAS IDEIAS então saber se é Pedro, Tiago e João (no barquinho) não é o que importa.
      Mas, sobre os saberes localizados de Dona Haraway, sou mulher, negra, nordestina, psicóloga...

      Sim, sou a mesma pessoa do comentário ali em cima

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  8. Bom panfleto. Porém, com muitas falácias retóricas como todo bom panfleto. Cito duas:

    - não há relação alguma entre desaprovar um comportamento e autorizar um assassinato. são atitudes distintas e creio que muitos religiosos não concordam com o segundo. falácia da falsa correlação causal.

    - nem toda santa é branca. falsa generalização. assim como, nem todo santo foi sempre casto. e nem é o caso que todos precisam ser santos para seguir uma religião.

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    1. Renato, o conceito de John Austin sobre performatividade poderá te fazer entender esta relação, mas que isso, caso seja religioso, o poder da língua apresentada por Tiago no Capítulo 3, também te ajudará... Quanto às santas negras, conheço apenas a Nossa Senhora Aparecida, mas que foi embranquecida no imaginário popular... quando disse sobre branca como padrão de mulher posta como modelo pelas imagens "sacras", não me refiro apenas à cor e sim ao padrão de mulher que nada tem que ver com as grandes mulheres das culturas africanas, indianas, asiáticas, indígenas...

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    2. olá Dário,

      Grato pela sua resposta. Eu já li um pouco a respeito dos atos de fala perfomativos do Austin e ainda não vi associação com o que você escreveu. Estes atos são como realizar ações através da enunciação de frases, por exemplo. Ao escrever sobre a falsa relação pensei nas críticas de David Hume a respeito da noção de causalidade. Essa linha de argumento é muito usada, por exemplo, na filosofia da ciência para prevenir atribuições precipitadas de causalidade entre dois eventos quando de fato, o que há são meras correlações temporais.

      A respeito dos santos não tenho muito o que dizer, mas se você pesquisar encontrará uma lista de santos negros. Um exemplo que me veio a cabeça foi Agostinho que era negro e africano.

      Bom, apesar de não concordar totalmente com o conteúdo do ato, procuro compreender as razões que o motivaram e dialogar com ele. Percebo também que obtiveram sucesso, quando imagino que uma das intenções era chamar atenção da sociedade, podendo até chocar as pessoas mais conservadoras. Foi positivo no sentido de a maioria perceber que existem minorias que acreditam e vivem com valores diferentes do que eles acreditam.

      E como você disse o ato é apenas uma expressão da liberdade de expressão que, felizmente, ainda é um direito assegurado na nossa sociedade.

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    3. Meu caro, a medida em que Austin propõe que todo enunciado tem sentido performativo, isto é, fazer com que os atos tornem-se ação, ele observa que mesmo os enunciados constativos também são performativos. Deste modo, ele diferencia aqueles que demandam um contexto (a legitimação do enunciador, o local em que se enuncia, os ritos da enunciação) e aqueles que, anteriormente, definia como constativo e que, portanto, não necessariamente demanda este contexto, porém tem efeitos de ação. No caso do discurso religioso, quando o pastor ou o padre afirma que determinada relação é pecaminosa (e neste sentido se enquadra no primeiro caso, pois ele é legitimado, fala de um lugar próprio e segue os ritos da enunciação). Contudo, à medida em que os mecanismos discursivos operam-se numa suposta "democracia", tais discursos tendem a operar apenas o efeito constativo ou, em termos religiosos, o discurso verdadeiro: "homossexuais são pecadores, porque a prática da homossexualidade é pecado". Contudo, estes discursos que marcam o sujeito homossexual, é dado(inclusive por uma construção histórica da ação da Igreja na vida das pessoas)a autorização para que a mesma seja alvo de violência psicológica, moral, verbal e física. Em tempos passados, a Igreja fazia isto explicitamente, hoje o faz de modo sutil nos ditames desta suposta democracia, mas se vc pegar o caso dos países islâmicos, da Rússia ou de alguns países africanos esta relação é direta. A Pragmática permite com que, por meio da análise dos discursos, perceba-se os mecanismos discursivos que autorizam essa cultura de violência. Quando diz que esta argumentação do texto é uma falácia da falsa correlação causal, vc se equivoca com o uso deste conceito.

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  9. O autor confessa que são mentirosas as asneiras que diz quando põe no texto da descrição do blog que estes seus textos são contra a verdade.

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    1. E o que vc entende por verdade, meu caro? Por favor, peço que assine seu texto...

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  10. Olhos de Ressaca responda por favor pois estou numa confusao ideológicA.Concordo com tudo o que foi dito. A instituição que é a igreja católica é sim responsável pela desconsideração dos direitos humanos básicos e até do direito à vida em muitos momentos da nossa história e até os dias de hoje.Mas eu acho que a religião é em si, algo muito belo, libertador mesmo porém é utilizada como meio para opressão pelo capital.A igreja católica é sim, repito, uma instituição que desrespeita os direitos humanos e o direito à vida , mas eu não acho que a grande maioria dos católicos concorde conscientemente com essas atitudes, eu os enxergo como uma massa alienada. Eu não acredito que o problema é o simbolo, mas sim o que fazem do símbolo entende.Do mesmo modo que se usa a ciencia pra oprimir , se usa a religião. O problema não estaria na religião ou na ciencia em si, mas no modo como ela é utilizada.Este meu raciocínio dá margem pra legítimar a quebra das imagens ou pra não legitimar.Por isso a minha confusão.

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    1. Oi Lê, penso que não se tata de legitimar ou não legitimar, mas de problematizar. Veja: Não se trata de concordar ou não com a quebra das imagens, mas de colocar o acontecido (pois já aconteceu) na problematização para não cair na normatização disciplinar naturalizada em nós por esta instituição. Não sou eu quem digo como deva ser a reação do oprimido, como este oprimido deva responder, mas a partir das respostas que ele dá, eu posso problematizá-la e pontecializá-la para que seus efeitos sejam os mais positivos... eu acredito nisso, eu entendo isso como coerência revolucionária. Agora de outra forma, se me couber apenas censurar as ações a partir de valores que historicamente me educaram a entender como certo ou errado, estarei advogando em favor do opressor.

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  11. O feminismo precisa mostrar que a religião, a crença e a fé são muito diferentes da igreja como instituição. A igreja(instituição) é fruto do uso da crença como meio para empoderamento de uma minoria. E opressão gera empoderamento(basta pensar que no sistema capitalista é lucrativo ter uma classe de seres humanos que recebe menores salários, por exemplo, basta pensar na demonização de tantos povos que foram dizimados pela igreja católica e na necessidade de dizimá-los para produzir em cima deste espaço).A problemática não estaria no crer em uma santa, estaria em deturpar esta crença em prol de determinados objetivos(que eu acredito que é o que aconteçe com muitas igrejas).A imagem da santa , pra mim, representa a crença das pessoas e não a igreja católica como instituição.No entanto, eu reconheço que a imagem foi um símbolo utilizado para a opressão e por isso eu não legitimo e nem deslegitimo o incidente.

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    1. Não acredito que esta dissociação entre fé e instituição seja possível, posto que a segunda produz a primeira, isto é, A fé é produzida pela instituição. Nesse sentido, repito o que disse no texto: "No caso das mulheres há um agravante. Longe de se restringir ao campo do religioso, tais imagens performatizam o modelo ideal do ser mulher. A performance destas imagens tem, no campo do simbólico, o efeito danoso de disciplinar o que seja o normal e assim expulsar das possibilidades de feminino, inúmeras diversidades, tratando-as como anormais. Neste sentido, tais imagens "sacras" femininas, associadas ao campo do sagrado, sacralizam o corpo da mulher, mesmo o corpo de mulheres que não são católicas. Ao sacralizá-lo, rouba desta mulher o seu direito ao corpo e coloca no campo da condenação, do castigo eterno, da danação, todas as mulheres que não se enquadrarem nesta norma disciplinadora da imagem sacra. As duas imagens têm efeitos violentos na construção simbólica do que seja ser mulher: pura, santa, imaculada, assexuada, branca, bela, singela, meiga e, portanto, com direito à vida. Qualquer mulher que fuja deste modelo, qualquer mulher que não se enquadre neste ideal, qualquer mulher que rompa com esse modelo deve ser punida simbolica e materialmente e, portanto, condenada à morte".

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  12. DESABAFO 2: MARCHA DAS VADIAS ( 27 de julho de 2013)
    Há cerca de dois anos fiz uma série de fotos de um evento na Zona Norte do Rio a convite de um amigo que trabalha na área de saúde da prefeitura. Tempos depois resolvi postar algumas dessas fotos aqui no Facebook e, pro meu espanto, recebi comentários pedindo pra retirar as fotos (não por parte das fotografadas),alguns fazendo piadinhas, outros dizendo que aquilo era desnecessário, uns (vindo de mulheres) se colocando com nojo!Que fotos eram essas afinal? Eram mulheres amamentando, dezenas de mulheres amamentado carinhosamente seus filhos, num lindo gesto, tantas vezes representado em inúmeras pinturas católicas quando se quer "humanizar" Jesus. Gesto este que representa a vida, o alimento, o carinho, a continuidade, o amor, e em tempos modernos, à luz da ciência, gesto que significa prolongar a vida do bebê, fortalecendo-o, imunizando-o e evitando problemas futuros. Sendo chato, posso citar aqui algumas pinturas como a de Filotesi dell`Amatrice ( 1508 - Maria Misericordiosa com os seios jorrando leite para as almas no purgatório) e a obra de autor desconhecido " A Virgem e o menino a frete de um guarda-fogo" , pintura do século XV. O que me assusta é que estamos no século XXI e as pessoas ainda se sentem incomodadas com certo tipo de representação feminina, qua a meu ver estava absolutamente contextualizada.Achei a Marcha das Vadias linda, lindas vadias com seus seios à mostra realimentando essa sociedade hipócrita de imagens e valores que dever ser relidos. Quanto a performance, eu que não sou católico e portanto não tenho o hábito de me confessar, confesso aqui que achei agressivo sim, chocante, fiz as fotos e não postei (pronto falei!). Eu não tão conservador e não tão libertário, acho que ainda não estamos "preparados" pra ler essas tão simbólicas imagens dentro de suas inúmeras possibilidades interpretativas. ( Algo extremamente libertador e ao mesmo tempo repulsivo me impulsionava a fotografar, mas o peso do Cristianismo, da moral e do susposto "respeito pelo outro" me fazia recuar, contraditório,não?). Voltei no tempo, pensei no que representa essa Igreja Européia, universalista, e os grandes negócios que ela representou e representa, não se trata de fé. Lá por perto estavam os peregrinos, na sua grande maioria, coitados, latinos como eu, mexicanos, paraguaios, argentinos, peruanos, chilenos. Países pobres, por que? Como essa fé se proliferou sobretudo entre nós do novo mundo?! Cruz e espada...cruz e espada não saia da minha cabeça. De repente no meio daquela gente toda, uma cruz no cú!E a derrubada de inúmeros preconceitos!!! Sim, isso agride!!! Pra não correr o risco de dar um tiro no pé, como vem sendo dito, e correr o risco de cair na esparrela da "grande mídia" preferi não postar. Ora , se os seios que nos alimentaram nos chocam!!!

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    1. Concordo com o Marcelo. "...acho que ainda não estamos "preparados" pra ler essas tão simbólicas imagens dentro de suas inúmeras possibilidades interpretativas. [...] Ora , se os seios que nos alimentaram nos chocam!!!"

      Toda forma de reivindicar direitos é válida desde que não agrida o direito do outro.
      Uma cruz, um cacto, um pênis, uma língua, um braço no ânus (ou em qualquer outra parte do corpo) não é violência, não é agressão, para quem sente prazer nessa (ou necessidade dessa) prática, desde que os envolvidos (tanto os que praticam o ato, quanto os que o presenciam) concordem com o mesmo. O que não foi o caso dessa performance.

      Só para dizer: não sou adepta de nenhuma religião.

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  13. o Papa disse que o problema não é um “lobby gay”, mas simplesmente um “lobby”, seja de políticos, grupos nações ou outros. E contou que os bispos do país estão preocupados.Não somos máquinas. Temos que achar o melhor. A característica de, seja o que for, tem que ser transparência e honestidade....A Igreja já se expressou perfeitamente sobre aborto e homossexualidade. Eu não queria voltar sobre isso. Não era necessário voltar sobre isso, como também não era necessário falar sobre outros assuntos. Eu também não falei sobre o roubo, sobre a mentira. Para isso, a Igreja tem um doutrina clara. Queria falar de uma coisa positiva, que abrem caminho aos jovens. Além disso, os jovens sabem perfeitamente qual a posição da Igreja...Uma Igreja sem as mulheres é como o colégio apostólico sem Maria. O papel da mulher na Igreja não é só maternidade, a mãe da família. É muito mais forte. A mulher ajuda a Igreja a crescer. E pensar que a Nossa Senhora é mais importante do que os apóstolos! A Igreja é feminina, esposa, mãe. O papel da mulher na Igreja não deve ser só o de mãe e com um trabalho limitado. Não, tem outra coisa. O Papa Paulo VI escreveu uma coisa belíssima sobre as mulheres. Creio que se deva ir adiante esse papel. Não se pode entender uma Igreja sem uma mulher ativa. Um exemplo histórico: para mim, as mulheres paraguaias são as mais gloriosas da América Latina. Sobraram, depois da guerra (1864-1870), oito mulheres para cada homem. E essas mulheres fizeram uma escolha um pouco difícil. A escolha de ter filhos para salvar a pátria, a cultura, a fé, a língua. Na Igreja, deve-se pensar nas mulheres sob essa perspectiva. Escolhas de risco, mas como mulher. Acredito que, até agora, não fizemos uma profunda teologia sobre a mulher. Somente um pouco aqui, um pouco lá. Tem a que faz a leitura, a presidente da Cáritas, mas há mais o que fazer. É necessário fazer uma profunda teologia da mulher. Isso é o que eu penso. Sobre a participação das mulheres na Igreja, não se pode limitar a alguns cargos: a catequista, a presidente da Cáritas. Deve ser mais, muito mais. Sobre a ordenação, a Igreja já falou e disse que não. João Paulo II disse com uma formulação definitiva. Essa porta está fechada. Nossa Senhora, Maria, é mais importante que os apóstolos. A mulher na Igreja é mais importante que os bispos e os padres. Acredito que falte uma especificação teológica.
    Tenho visto que, muitas vezes na Igreja, se buscam os pecados de juventude, por exemplo. E se publica. Abuso de menores é diferente. Mas, se uma pessoa, seja laica ou padre ou freira, pecou e esconde, o Senhor perdoa. Quando o Senhor perdoa, o Senhor esquece. E isso é importante para a nossa vida. Quando vamos confessar e nós dizemos que pecamos, o Senhor esquece e nós não temos o direito de não esquecer. Isso é um perigo. O que é importante é uma teologia do pecado. Tantas vezes penso em São Pedro, que cometeu tantos pecados e venerava Cristo. E este pecador foi transformado em Papa. Neste caso, nós tivemos uma rápida investigação e não encontramos nada. Vocês vêm muita coisa escrita sobre o lobby gay . Eu ainda não vi ninguém no Vaticano com uma carteira de identidade do Vaticano dizendo que é gay. Dizem que há alguns. Acho que quando alguém se vê com uma pessoa assim, devemos distinguir entre o fato de que uma pessoa é gay e fazer um lobby gay, porque todos os lobbys não são bons. Isso é o que é ruim. Se uma pessoa é gay, procura a Deus e tem boa vontade, quem sou eu, por caridade, para julgá-la? O catecismo da Igreja Católica explica isso muito bem. Diz que eles não devem ser discriminados por causa disso, mas devem ser integrados na sociedade. O problema não é ter essa tendência. Não! Devemos ser como irmãos. O problema é fazer lobby, o lobby dos avaros, o lobby dos políticos, o lobby dos nações, tantos lobbys. Esse é o pior problema.

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